Tecnologia reduz custo facilita monitoramento neurológico de bebês Ouvir 13 de julho de 2025 *O artigo foi escrito por Richardson Naves Leão, professor associado em neurociências e psicobiologia e líder do Laboratorio de Neurodinâmica do Instituto do Cérebro, Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), e publicado na plataforma The Conversation Brasil. Bebês prematuros constituem uma população especialmente vulnerável a problemas neurológicos. Estima-se o nascimento de 340 mil bebês prematuros por ano no Brasil, sendo que ao menos metade dessas crianças poderá apresentar alguma alteração no neurodesenvolvimento nos primeiros anos de vida. A asfixia perinatal, que acomete quatro em cada mil nascimentos, é mais um fator crítico adicional, o que torna a detecção precoce ainda mais urgente. Quanto mais prematura a criança, maiores são as chances de dificuldades associadas ao desenvolvimento cerebral. Muitos desses bebês precisam ficar por longos períodos em unidades de terapia intensiva (UTIs) neonatais, com convulsões, distúrbios motores e cognitivos, entre outras alterações. Além de problemas mais imediatos, como a paralisia cerebral, essas complicações podem aumentar a possibilidade de surgirem doenças relacionadas ao neurodesenvolvimento, como o deficit de atenção ou autismo. Portanto, é essencial fazer o monitoramento neurológico rigoroso dessas crianças, oferecendo a elas a possibilidade de diagnóstico precoce e intervenção médica rápida. Na prática clínica, porém, há inúmeras dificuldades tanto técnicas quanto humanas para implementar esse acompanhamento. Exames avançados, como a eletroencefalografia convencional, frequentemente demandam equipamentos caros e profissionais altamente treinados para interpretação dos resultados, o que limita sua disponibilidade especialmente em regiões mais remotas ou com menos recursos e torna sua adoção em larga escala inviável. Com o propósito de viabilizar e ampliar esse monitoramento, coordeno um projeto de pesquisa no Instituto do Cérebro, em Natal (RN), que desenvolveu uma nova plataforma tecnológica com essa finalidade. O ponto de partida da inovação foi o reconhecimento de que seria possível utilizar equipamentos menos complexos para captar os sinais neurológicos. Nossa percepção foi de que tornar o equipamento mais acessível permitiria popularizar o monitoramento, garantindo uma maior abrangência e qualidade no cuidado neurológico dos prematuros, especialmente em locais com poucos recursos especializados. Análise automatizada de padrões cerebrais A nova plataforma é composta por sensores que captam sinais elétricos do cérebro, integrados a um sistema de vídeo com câmera térmica e sensores de movimento. Todos esses dados são reunidos por um circuito eletrônico embarcado e transmitidos via internet sem fio (IoT), o que permite que médicos avaliem a atividade cerebral em tempo real, mesmo à distância. Os sensores foram desenhados para uso contínuo em bebês prematuros, com eletrodos flexíveis e biocompatíveis que evitam lesões na pele — um problema comum nos equipamentos convencionais. O protótipo é leve, ergonômico e permite fácil remoção durante o contato pele da criança e da mãe. A plataforma ainda monitora variáveis como temperatura, frequência cardíaca, oxigenação e movimentos atípicos, permitindo uma análise mais abrangente do estado neurológico do bebê. A base da nova plataforma é um sistema eletrônico simplificado que utiliza amplificadores de instrumentação de uso geral, semelhantes aos encontrados em GPSs e smartphones. Esses amplificadores são capazes de captar sinais elétricos cerebrais de baixíssima amplitude — na faixa de microvolts — que refletem a atividade neural dos recém-nascidos. Como funciona o sistema Ao contrário dos eletroencefalógrafos tradicionais, que operam com componentes caros e arquitetura fechada, o sistema que desenvolvemos emprega sensores de uso geral, amplamente testados em outras aplicações e com custo muito inferior. Os sinais captados são processados em tempo real por um circuito embarcado que também recebe dados de acelerômetros, câmeras térmicas e sensores de temperatura e frequência cardíaca. Todo esse conjunto é integrado a uma plataforma de internet das coisas (IoT), que transmite as informações por conexão sem fio para dispositivos móveis ou estações de monitoramento, permitindo que médicos neuropediatras acompanhem remotamente a evolução dos bebês. Leia também Saúde Estudo: bebês sentem dor antes mesmo de entender o que ela significa Saúde SUS pode adotar novo imunizante contra VSR para bebês. Entenda Distrito Federal Aprovado PL que garante transporte gratuito a pais de prematuros Saúde Filho de Eliezer e Viih Tube: saiba o que significa bebê a termo Os sensores foram desenhados para ser usados com eletrodos flexíveis de uso contínuo para minimizar as lesões na pele. Os dispositivos podem ser conectados/desconectados dos bebês por mecanismos de engate rápido que facilitam o contato materno durante o cuidado intensivo. Uma das grandes diferenças em relação ao eletroencefalograma convencional está na concepção técnica e funcional do sistema. Enquanto os equipamentos tradicionais requerem ambientes especiais, operadores treinados e interpretadores especializados, nossa plataforma foi projetada para funcionar com componentes modulares de mercado, sem a necessidade de salas específicas ou infraestrutura hospitalar sofisticada. Opção para locais com poucos recursos O sistema automatiza boa parte da interpretação dos sinais por meio de algoritmos de inteligência artificial (IA). Eles foram incorporados para reconhecer padrões associados a distúrbios neurológicos, distinguindo esses sinais de artefatos gerados por movimento, piscadas ou interferência elétrica. A IA também é usada para compensar pequenos erros operacionais ou de posicionamento de eletrodos. É importante ressaltar que o objetivo da plataforma não é substituir o neuropediatra nem a eletroencefalografia convencional, mas oferecer uma alternativa básica e viável para serviços que não dispõem desses recursos. A padronização do sinal e o uso de algoritmos de inteligência artificial baseados em código aberto permitem que o sistema aprenda a distinguir com cada vez mais precisão os padrões patológicos de artefatos de ruído ou movimento, o que reduz o risco de falsos positivos. Essa abordagem oferece vantagens como redução expressiva de custos, portabilidade, facilidade de uso, integração de dados multimodais e possibilidade de monitoramento remoto contínuo. Com isso, torna-se viável realizar o acompanhamento neurológico em larga escala, inclusive em regiões remotas ou em UTIs sem equipe especializada permanente. A fase de validação e aplicação clínica desta tecnologia conta com a colaboração de pesquisadores do Instituto do Cérebro, do Departamento de Engenharia Elétrica e da Maternidade Escola Januário Cicco, todos vinculados à UFRN, fortalecendo a integração entre ciência e prática assistencial. Após a validação clínica, o equipamento também permitirá a detecção precoce de convulsões subclínicas, que muitas vezes passam despercebidas na prática clínica convencional, possibilitando intervenções rápidas que podem evitar lesões permanentes. Burocracia e resistência cultural Apesar das inovações e do potencial de impacto positivo, o desafio de escalar o uso dessa tecnologia ainda é grande. A regulamentação de dispositivos médicos no Brasil impõe um caminho burocrático e oneroso, muitas vezes incompatível com propostas voltadas à saúde pública. Embora o equipamento utilize componentes semelhantes aos de wearables certificados por órgãos como o Inmetro e a Anatel, a exigência de certificação específica pela Anvisa — mesmo para tecnologias não invasivas — pode inviabilizar sua produção em massa a baixo custo. Também há uma resistência cultural à ideia de que dispositivos de menor custo possam oferecer qualidade diagnóstica comparável à dos sistemas tradicionais, o que dificulta sua aceitação por parte de instituições e profissionais mesmo quando já validados tecnicamente. Para superar essas dificuldades, nosso grupo está articulando parcerias com agências de fomento, instituições científicas e empresas interessadas em saúde digital, com o objetivo de realizar estudos multicêntricos, ampliar a base legal da patente, viabilizar economicamente a produção em larga escala e implementar testes-piloto em hospitais públicos. Esse esforço também envolve o desenvolvimento de novos materiais para eletrodos, em parceria com universidades como a Univerdade Federal de Juiz de Fora, e a implantação de soluções sem fio mais ergonômicas e adequadas ao contato contínuo entre mãe e bebê, como um sensor tipo “bandaid” na testa do recém-nascido que possibilite monitoramento discreto e eficaz. A adoção em ampla escala do monitoramento neurológico neonatal pode representar uma mudança profunda na forma como cuidamos de bebês prematuros e recém-nascidos em risco. Ao permitir a vigilância contínua e remota da atividade cerebral, mesmo em unidades com poucos recursos ou sem neuropediatras disponíveis, a plataforma amplia o acesso ao diagnóstico precoce de distúrbios neurológicos. A universalização do cuidado neurológico permitirá que intervenções rápidas reduzam o risco de sequelas motoras e cognitivas, promovendo maior equidade no sistema de saúde. Da mesma forma que hoje é impensável atender um recém-nascido sem medir a saturação de oxigênio, o monitoramento neurológico pode e deve se tornar um padrão básico de atenção neonatal. Para isso, é necessário que políticas públicas, gestores e profissionais de saúde incorporem o monitoramento cerebral à rotina assistencial, reconhecendo que proteger o cérebro no início da vida é a base para o desenvolvimento e a formação de um cidadão pleno. Siga a editoria de Saúde e Ciência no Instagram e fique por dentro de tudo sobre o assunto! Notícias
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