Chip da beleza: o que você precisa saber sobre o implante hormonal Ouvir 1 de novembro de 2024 Embora o nome dê a impressão de que “chip da beleza” é apenas um tipo moderno de tratamento estético, os implantes hormonais estão no centro de uma polêmica devido aos danos que podem causar em usuários e usuárias. A produção dos implantes foi proibida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no dia 18/10 devido aos riscos relacionados a doenças cardiovasculares e tromboembolismo. A inciativa de provocar a Anvisa sobre os “chips da beleza” partiu de sociedades médicas ao perceber um aumento de emergências entre as pacientes que poderiam ser relacionadas às intervenções hormonais estéticas. Na terça-feira (22/10), o Senado decidiu entrar no tema – a fabricação e o implante dos chips compõe um mercado milionário -, convocando debates para avaliar a proibição da Anvisa e as possibilidades de regulamentação dos chips. Os defensores dos chips da beleza alegam que as complicações só ocorrem em um número pequeno de usuários, e que muita gente se beneficia do uso. Especialistas ouvidos pelo Metrópoles alertam, no entanto, que os perigos são reais e, entre eles, há o risco de morte. Leia também Brasil Senado vai discutir proibição do “chip da beleza” pela Anvisa Saúde “‘Chip da beleza’ acabou comigo”, relata professora que usou implante Saúde Chip da beleza: entenda o que é o dispositivo proibido pela Anvisa Saúde Chips da beleza: Anvisa proíbe venda e uso de implantes hormonais O que são os chips da beleza? Os chamados chips da beleza são dispositivos que liberam hormônios no organismo ao longo de meses. Eles são feitos de silicone e tem o tamanho aproximado de um palito de fósforo. São colocados no corpo em um procedimento com anestesia local, geralmente ficam fixados nos glúteos. O endocrinologista Paulo Augusto Miranda, presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), explica que a proibição busca frear duas discrepâncias verificadas no uso dos chips. “A administração de hormônios precisa de indicações específicas e, no formato dos chips, isso não acontecia. Além disso, a forma que são produzidos, manipulados muitas vezes, sem receita médica, acarretava em risco para as pacientes”. Os dispositivos à venda no Brasil costumam sem feitos em farmácias de manipulação ou em pequenas indústrias combinando vários hormônios. Não há um padrão de segurança e também não é possível assegurar que as doses indicadas são as que estão no componente final. Os principais ingredientes costumam ser testosterona, oxandrolona e/ou gestrinona, mas vários outros hormônios podem entrar na receita, como estradiol, oxandrolona, ocitocina e NADH. Os chips começaram a ser vendidos como um tratamento para a endometriose, mas ganharam variações promovendo benefícios como conter os sintomas da menopausa, facilitar o emagrecimento e o ganho de massa muscular, combater o envelhecimento, melhorar o sono e até aumentar a libido. Sociedade de Endocrinologia condena chip da beleza: “risco real” A proibição da Anvisa se refere a todo tipo de terapia hormonal? Muitas notícias falsas circularam após a proibição da Anvisa sugerindo que todos os tratamentos de reposição hormonal estavam ameaçados. A ginecologista Lia Cruz Vaz da Costa Damásio, diretora de Valorização Profissional da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), porém, explica não é o caso. “A resolução da Anvisa é muito específica para combater implantes manipulados sem regulamentação. No Brasil, só há um implante de hormônio regulamentado e autorizado: o Implanon, com hormônio etonogestrel, com efeito anticoncepcional por 3 anos. Os tratamentos de terapia hormonal que não usam a via implante estão liberados. Ou seja, não há restrição para reposição hormonal feita com remédios, pomadas, adesivos – esses passaram por várias fases de testes clínicos que nos permitiram conhecer seus efeitos adversos possíveis. Os chips da beleza não têm esse mesmo nível de segurança”, resume a médica. Quais os riscos do uso do chip da beleza? A Anvisa lançou um alerta em 24/10 listando as principais complicações observadas em pacientes que fizeram uso de implantes manipulados. Segundo a agência, foram relatados elevação de colesterol, pressão alta, risco aumentado de acidente vascular cerebral (AVC) e de arritmia cardíaca. Além disso, também ocorreu crescimento excessivo de pelos no corpo, queda de cabelo, aumento na quantidade de acne, alteração na voz e insônia. A lista foi feita copilando casos registrados por médicos em uma plataforma online criada pela SBEM para que médicos relatassem os efeitos colaterais do uso de implantes. Em apenas dois meses, 269 casos foram anotados. “Os efeitos adversos aparecem devido a interação entre as várias substâncias que são combinadas nos implantes. Às vezes, a causa é a absorção de altas doses facilitada pela via intradermica. Um dos relatos documentados aponta que uma paciente absorveu níveis tão altos de estradiol que superou mil, o nível mais alto registrado anteriormente. O laboratório não conseguia nem mais medir”, resume Lia. O presidente da SBEM ressalta que alguns dos efeitos adversos dos chips são irreversíveis. “Alguns efeitos sobre a pele e os cabelos, como queda e acne, são transitórios. Mas há outros mais duradouros, como a supressão de função dos ovários ou testículos, que leva à infertilidade. Também temos alterações renais, hepáticas e psiquiátricas, ou seja, alterações de comportamento, levando a maior agressividade, que podem impactar sobre a vida das pessoas”, afirma Paulo Augusto Miranda. A representante da Febrasgo cita o aumento do clitóris e as mudanças na voz feminina como mudanças permanentes. Sociedades médicas recomendam que pacientes busquem endocrinologistas para avaliar a retirada Várias entidades se posicionaram contra os chips Uma carta feita por entidades médicas em dezembro do ano passado já havia alertado para os riscos dos chips da beleza e pedido uma atuação mais atenta da Anvisa em relação aos dispositivos. A carta aberta foi assinada por representantes de 34 sociedades médicas como a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), a Associação Brasileira para Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (Abeso) e a Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), entre outros. Em abril de 2023, o Conselho Federal de Medicina (CFM) já havia proibido todos os médicos do país de prescreverem implantes hormonais com fins estéticos. A entidade foi procurada pelo Metrópoles para comentar o cenário atual dos chips da beleza, mas não enviou posicionamento até o fechamento desta reportagem. Tenho chip da beleza implantado. O que devo fazer? Para pessoas que uso o implante, a indicação é buscar um médico que faça a avaliação da possibilidade de uma eventual retirada do dispositivo. Em comunicado, a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) recomendou que se buscasse endocrinologistas com registro de especialista no site do Conselho Federal de Medicina (CFM). Há chance de os chips da beleza serem regulamentados? Como o assunto voltará a ser discutido no Congresso Nacional, as entidades ouvidas pelo Metrópoles apontam que é possível encontrar formas de regulamentação dos chips da beleza, desde que eles sigam os ritos de testes em três fases às quais todos os medicamentos estão submetidos. “Para regulamentar, seriam necessários estudos clínicos robustos que garantam a segurança dos usuários. Até agora não sabemos o que acontecerá no futuro para pessoas que usem estes implantes. Então para que a produção e comercialização deles seja permitida, eles devem passar por esses testes e, se forem comprovados como eficazes, se submeterem ao registro na Anvisa”, explicou o endocrinologista Clayton Macedo, representante da regional de São Paulo da SBEM. Até o momento, segundo a Febrasgo, o único implante que está fazendo testes clínicos para um eventual registro é o que mistura estradiol e testosterona para crescimento de massa muscular. 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