Hormônio do crescimento também tem efeito na regulação da ansiedade Ouvir 13 de dezembro de 2023 Conhecido por seu papel no crescimento de todos os tecidos do corpo humano, o hormônio do crescimento (GH, da sigla em inglês growth hormone) é também um poderoso ansiolítico. Um estudo realizado por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) aprofundou o entendimento sobre a capacidade do GH em reduzir a ansiedade e, pela primeira vez, identificou a população de neurônios responsável por modular os efeitos do hormônio em doenças neuropsiquiátricas, como o transtorno de ansiedade, depressão e estresse pós-traumático. No trabalho, apoiado pela FAPESP, os pesquisadores observaram que, ao retirar o receptor de GH de células neuronais que expressam o peptídeo somatostatina (um antagonista do hormônio de crescimento), houve um aumento do comportamento semelhante à ansiedade em camundongos machos. Os testes demonstraram ainda uma redução da memória do medo em animais de ambos os sexos. A descoberta pode permitir que no futuro novas classes de medicamentos ansiolíticos sejam desenvolvidas. Leia também Saúde Ansiedade: especialista lista 5 dicas para evitar o transtorno em 2024 Saúde Dezembro chegou! 5 dicas para lidar com a ansiedade de fim de ano Brasil Crianças repatriadas de Gaza estão com insônia e ansiedade Saúde Ansiedade silenciosa: os sintomas da condição confundida com estresse “A descoberta sobre o mecanismo envolvendo o efeito ansiolítico do GH abre caminho para uma possível explicação – meramente química – sobre esses distúrbios e por que em situações com maior ou menor secreção do hormônio do crescimento os indivíduos apresentam maior ou menor prevalência desses distúrbios”, afirma José Donato Júnior, professor do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP) e autor do artigo publicado no The Journal of Neuroscience. No estudo, os pesquisadores utilizaram três tipos de experimentos com os camundongos (campo aberto, labirinto em cruz elevado e caixa claro-escuro) para testar a capacidade dos animais de explorar o ambiente e de se colocar em risco. “São experimentos bem estabelecidos e que medem o comportamento do animal semelhante à ansiedade e à memória de medo (que está por trás dos movimentos de estresse pós-traumático). Com isso, foi possível verificar os efeitos do hormônio GH nesses animais”, explica Donato. O pesquisador afirma que ainda não se sabe por que no estudo não houve aumento de comportamento semelhante à ansiedade em camundongos fêmeas. “Acreditamos que seja pelo fato de haver um dimorfismo sexual. Sabemos que a estrutura nessa área do cérebro onde estão os neurônios que estudamos é um pouco diferente entre machos e fêmeas. Não por acaso, alguns transtornos são diferentes entre homens e mulheres”, diz. A parte química Milhares de pessoas sofrem de doenças neuropsiquiátricas em todo o mundo. Embora ansiedade e depressão estejam entre os transtornos mais comuns, ainda não está totalmente esclarecido quais são as causas exatas para estes problemas. Acredita-se, inclusive, que possa ser uma combinação de fatores entre estresse, genética, pressões sociais, econômicas, de gênero, entre outros que possam contribuir para a ocorrência desses transtornos. Evidências crescentes sugerem que os hormônios também podem desempenhar um papel importante na regulação de diversos aspectos neurológicos, modificando assim a predisposição a esses distúrbios. Alterações nos níveis de hormônios sexuais como o estradiol, por exemplo, afetam comportamento semelhante à ansiedade ou depressão e memória de medo em roedores e humanos. Outros estudos, ainda preliminares, demonstraram que os glicocorticoides (hormônios sintetizados a partir do cortisol) podem estar envolvidos no surgimento de doenças neuropsiquiátricas. Pelo menos no caso do GH ainda não havia sido identificado o mecanismo de regulação do hormônio em neurônios associados a doenças neuropsiquiátricas. “Demonstramos que o hormônio do crescimento muda a sinapse alterando estruturalmente os neurônios que secretam somatostatina”, relata o pesquisador. 3 Cards_Galeria_de_Fotos (5) A ansiedade é uma espécie de condição psíquica caracterizada por preocupação constante e excessiva de que algo negativo possa acontecer. Segundo pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), é, ainda, uma sensação difusa de desconforto carregado por sentimento frequente de apreensão que pode desencadear transtornos Peter Dazeley/ Getty Images ****Foto-crianca-sentada-no-chao.jpg De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é o país mais ansioso do mundo, e registrou ainda mais casos da condição durante a pandemia da Covid-19. Além de adultos, a ansiedade também pode se manifestar em crianças por diversos motivos, como divórcio dos pais, provas ou problemas na escola, por exemplo Elva Etienne/ Getty Images *****Foto-pessoa-com-a-mao-na-boca-2.jpg Apesar de ser considerada relativamente comum, uma vez que pode atingir qualquer pessoa por qualquer motivo, a ansiedade se torna um verdadeiro problema quando tudo vira motivo de preocupação exagerada e o paciente passa a apresentar crises Tara Moore/ Getty Images ****Foto-pessoa-com-a-mao-na-cabeca-2.jpg A crise de ansiedade é uma situação que causa grande sensação de angústia, nervosismo e insegurança, como se algo de muito mau, e que foge completamente do controle, fosse acontecer a qualquer momento Getty Images ****Foto-pessoa-sentada-pensativa.jpg A crise surge, normalmente, devido a situações estressantes específicas e que geram gatilho, como precisar fazer uma apresentação, ter prazo curto para entregar um trabalho, estar em algum lugar que não gostaria ou ter sofrido uma perda, por exemplo Tara Moore/ Getty Images ****Foto-pessoa-deitada-em-posicao-fetal.jpg Entre os sintomas de uma crise de ansiedade estão: batimentos cardíacos acelerados, sensação de falta de ar, formigamento no corpo, sensação de leveza na cabeça, dor no peito, náuseas, transpiração excessiva, tremores, entre outros Holly Wilmeth/ Getty Images ****Foto-pesoa-sentada-chorando.jpg Estes sintomas ocorrem devido ao aumento do hormônio adrenalina na corrente sanguínea, algo normal quando a pessoa enfrenta um momento importante. Contudo, se os sintomas se tornarem constantes, podem sinalizar um transtorno de ansiedade generalizada Klaus Vedfelt/ Getty Images ****Foto-pessoa-sentada-conversando-com-outra-pessoa-2.jpg O que se deve fazer durante uma crise de ansiedade depende da gravidade e da frequência dos sintomas e, por isso, o ideal é sempre receber aconselhamento especializado, de um psiquiatra ou psicóloga MICROGEN IMAGES/SCIENCE PHOTO LIBRARY/ Getty Images ****Foto-pessoa-com-a-mao-no-peito.jpg Apesar disso, realizar exercícios de respiração, ingerir chá calmante, tentar conversar com alguém de confiança, descansar, desligar a mente, fazer atividades físicas que goste ou tentar manter o pensamento em algo que dê conforto são algumas dicas que podem ajudar a aliviar o problema Jamie Grill/ Getty Images ****Foto-pessoa-com-a-mao-no-peito-2.jpg Quando a crise de ansiedade acontece pela primeira vez, ou não se tem certeza do que está acontecendo, é importante procurar um hospital para garantir que não seja outro problema mais grave, como o infarto Science Photo Library/ Getty Images ****Foto-pessoa-sentada-conversando-com-outra-pessoa-3.jpg De qualquer forma, caso as crises sejam frequentes, um especialista deve ser procurado para identificar a causa e iniciar um tratamento Fiordaliso/ Getty Images ****Foto-pessoa-sentada-conversando-com-outra-pessoa.jpg A ansiedade pode desencadear problemas que, dependendo dos sintomas, podem ser classificados como Transtorno de ansiedade generalizada (TAG), fobia social, síndrome do pânico, entre outros. Esses problemas podem gerar impacto na vida pessoal e profissional do paciente, por isso o quanto antes for diagnosticado, menos problemas serão enfrentados kupicoo/ Getty Images Voltar Progredir 0 No estudo, os pesquisadores comprovaram ainda que transtorno de ansiedade, memória de medo e estresse pós-traumático são faces diferentes de um mesmo circuito neuronal. Vale destacar que a ansiedade pode ser definida como um medo excessivo (falta de confiança). Já a memória do medo, explica Donato, está relacionada a algum evento negativo que gera uma resposta (uma alteração no cérebro) e toda vez que o animal ou o indivíduo é exposto novamente à mesma situação há uma reação exagerada de medo, podendo haver paralisia ou outros sintomas, como choro excessivo ou tremedeira. “Tudo isso acontece na mesma população de neurônios. São eles que expressam o receptor de GH e quando, no nosso experimento, desligamos esse receptor os animais tiveram uma redução na formação de memória do medo. Isso significa que a capacidade de formação dessa memória de medo fica prejudicada. Pode ser que em situações de estresse pós-traumático o GH seja um fator que contribua para o desenvolvimento desses transtornos”, diz. Isso porque uma sucessão de estresse crônico eleva outro hormônio denominado grelina – um potente estimulador da secreção de GH. “A grelina já vem sendo estudada no estresse pós-traumático há bastante tempo e alguns estudos demonstraram que é justamente essa secreção de GH induzida pela grelina que está aumentada no estresse crônico. Isso favorece o desenvolvimento da memória de medo e estresse pós-traumático no cérebro do animal.” Hormônio e prevalência de transtornos Em humanos, o hormônio do crescimento é secretado pela hipófise e liberado na corrente sanguínea, promovendo o crescimento de tecidos em todo o corpo humano por meio de formação proteica, multiplicação celular e diferenciação celular. Trata-se de um hormônio indispensável durante o período de crescimento. Ele é secretado principalmente durante a infância e adolescência. Há também um pico de secreção durante a gravidez. Depois, na velhice, há uma queda natural de GH. Problemas em sua secreção acarretam o nanismo, por exemplo, que se manifesta principalmente a partir dos 2 anos de idade, impedindo o crescimento e desenvolvimento durante a infância e adolescência. “Estudos anteriores realizados em seres humanos deficientes em GH já haviam demonstrado maior prevalência de depressão e ansiedade nesses indivíduos. Mas a causa disso ainda não foi estabelecida. Alguns autores atribuíam essa alta prevalência a problemas de imagem e bullying provenientes da baixa estatura”, conta Donato. O pesquisador ressalta que o estudo realizado em camundongos permite verificar o papel-chave do hormônio do crescimento no problema, sem o impacto de outras variáveis, como, por exemplo, problemas de imagem. “Nosso estudo permitiu saber até que ponto se trata de um efeito direto do hormônio e até que ponto é uma ação indireta do déficit de crescimento. Como conseguimos identificar o mecanismo envolvendo o GH, sabemos que ele é uma causa direta do problema de transtorno de ansiedade e, assim, fica mais fácil começar a pensar em terapias”, afirma. Donato conta que o grupo agora vai direcionar os estudos do GH para o período da gravidez. “É durante a gestação que ocorre um boom do GH. E é também após esse período que ocorre uma alta na prevalência de casos de depressão – a depressão pós-parto. É claro que existem pressões sociais, econômicas e outras relacionadas a esses tipos de transtornos. No entanto, não podemos esquecer que são períodos de um boom hormonal que podem desregular o funcionamento do cérebro, acarretando esses transtornos”, diz. (Fonte: Agência Fapesp) Siga a editoria de Saúde no Instagram e fique por dentro de tudo sobre o assunto! Notícias
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